Muitas de mim, que há muito não apareciam por aqui começam a
voltar. Devagar, começam a bater à minha porta, algumas parecem entrar pela
janela em um vôo razante, outras jamais saíram daqui apenas estavam adormecidas,
esquecidas. Há ainda as que estão longe! Bem longe, visíveis, acompanhadas do
vento com suas mãos fortes lá no norte, ou será sul?
Sempre houveram muitas de mim, dentro e fora daqui, a ponto
de andarem sozinhas pelo mundo sem que ninguém jamais tenha percebido a natural
semelhança. Há outras, que de tão profundas, marcadas, escondidas, medrosas e
frias jamais foram vistas, nem um traço sequer de seu rostos rotos.
E agora que voltam sem aviso?
Sem convite e aleatoriamente, batem a minha porta, pousam em
meus badulaques, vão entrando assim, refletem-se nos espelhos espalhados pela
casa e deixam seus corpos balançarem, vagarosamente, à brisa desta noite e
daqueles dias. Esquecidas, limpam restos de tinta que usavam para pintar e
marcar os seus tantos caminhos, perdidas.
O que faço com tantas e todas elas em mim?
Quem são? Sã, é como saber se quero saber quem já ficou, que
nem sei ao certo quem sou eu. Profundamente, quantas são realmente? Parte de
mim, despedidas de mim, excessos de mim nas invenções das boas taças de vinho,
da mente criativa ou do beijo doce e violento desejoso e enrustido em todos.
Ainda podem voar livres, libertas, cicatrizadas e ao mesmo
tempo se manterem presas, inacabadas junto a meus pés que tentam, em vão,
caminhar sem parar.
Será que sofrem, amam, gozam, fogem, ficam? Se vão.
Distraídas e já não se movem de tão ou mais envelhecidas do
que as que ainda estão na mais tenra infância, sem conhecimentos,
acontecimentos inevitáveis e tantas solidões escritas nas palmas das mãos.
Quem sou eu? Quem toca? Quem fala? Não há resposta de quem
está lá, de tantas, muitas de mim, nessa grande e única fila abraçadas a suas
invejas, seus desejos, suas vontades, suas alegrias, seus gozos, suas ausências
e algumas tristezas.
Selvagem, queima, voa. Destemida, unida. Só, solitária junto
a tantas e muitas de mim.
De volta a minha porta depois da longa caminhada entre a ponte
gigante, imaginária, que sai de tantas de mim até a janela de alguém que, de
tão imaginário, se tornou real parte de mim.
Andrea Chernioglo